Thursday, September 04, 2008

Contradição com Três Gotas de Coragem




Desde pequeno ele sabia que era diferente das outras pessoas. Não sabia exatamente o porque, mas sabia. Ele demorou (quase) a mesma quantidade de tempo para aprender amarrar os sapatos e também eram com velas que comemoravam seus aniversários, mas tudo isso não era suficiente para torná-lo igual naquela terra de leis rígidas. Quebrar qualquer uma delas era certeza de condenação.Ele gostava de tomar banho ouvindo música e amava fazer uma retrospectiva do dia antes de dormir, mas não eram essa particularidades que o tronavam diferente. Ele desde pequeno recebeu duas velas de funções diferentes. A de ser feliz e a de fazer feliz. E era impossível deixar as duas acessas ao mesmo tempo. Uma tirava a funcionalidade da outra. Era preciso apagar uma. Talvez para superar essa falha da natureza ou por sorte do destino também foi lhe dado três gotas de coragem que teriam que ser muito bem pensadas antes de serem usadas.

A primeira foi antes de uma apresentação da escola. Ele nunca fora tímido, mas sua língua desaparecia na frente de rostos desconhecidos. Conseguia ser engraçado na frente dos amigos íntimos. Um dos problemas é que na frente das outras pessoas não passava de um gago sem graça. O outro problema é que não possuía amigos íntimos. O amedrontava imaginar o que pensavam aquele mar de olhos concentrados num só ponto. Nele. Ele tinha medo que vissem o que havia dentro dele. Nem tristeza nem alegria. Um vazio. Tomou a primeira gota misturada com água e conseguiu dissolver toda aquela insegurança. Tornou-se comunicativo não só naquele dia, mas por todos os outros que o seguiriam. Pintou seu rosto quando lhe dava vontade e se vestiu de Drácula para fazer os outros rir. Fez os melhores amigos que alguém poderia ter, mas conheceu as piores pessoas também. E foi numa tarde de uma das “feiras” que um desses amigos precisou de sua ajuda. Não poderia desperdiçar sua segunda gota assim, mas o momento não lhe deu muita oportunidade para pensar. Tomou sua segunda gota para ajudá-lo, pois precisava enfrentar um grupo de covardes que o amedrontavam. Afinal era para isso que a coragem servia. Dissolver o medo.

Restava apenas uma gota e apesar de seus 20 e poucos anos, estava no começo de sua vida. Precisava usar no momento certo. Ele sabia no que seria. Ele que sempre foi o orgulho do pai e a esperança da mãe, não poderia destruir os sonhos deles assim tão facilmente. Ele que sempre havia sido o apoio dos amigos e o aluno exemplar não poderia quebrar assim as leis tão rígidas. Mas ele não queria apenas nascer, crscer, reproduzir e morrer. Seus sonhos eram maiores que isso. Pois por mais que ele havia crescido (fisicamente e pessoalmente), por mais vitorias que ele havia conseguido, era como se faltasse algo. Uma felicidade incompleta. Ele sempre se preocupou muito com os outros e pouco com ele, mas não porque queria se passar por moralista, mas porque sorriso também o faziam feliz. Mas um coração não é alimentado apenas de sorrisos. Ele se viu com dois caminhos a frente. Um de continuar agradando a todos que sempre agradou e o outro de ser feliz. Ele sabia que caminho escolher, só lhe faltava coragem. Tomou a ultima gota e a apagou uma das velas. (Vinícius D'Ávila)