Friday, January 30, 2009

Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças





E todos os sentimentos e qualidades que uma pessoa poderia escolher a ter. Foi ter saudades que ele quis.
Nem adianta questionar. Ele era tão saudosista, que quando se aproximava do fim de algum livro, ele adiava o fim, pois sabia que sentiria saudades dos personagens que ali conheceu.
E no último dia de aula do 3° ano, ele esperou todos irem embora pra ele apagar a luz. Queria olhar pela ultima vez pra aquelas cadeiras vazias e desorganizadas.
E juntou todos os seus centavos para compra das câmeras, a melhor. E registrar cada amigo que fez na epoca em que cantar em videoke era engraçado.
Ele tinha saudades das musicas que amou, mas hoje enjoou de escutar. Saudades dos lugares, das pessoas e dos filmes. Ele fechava os olhos, lembrava e sentia saudades.
Saudades de sua eterna blusa social preta que ele vestia em dias de festa, mas que de tanto lavar descorou. Saudades da época que sua mãe o acordava pra ir pra aula ao invés de despertadores. Saudades de encontrar o uniforme na beira da cama. Saudades de subir escondido a serra do parque so pra poder dizer que a vista la de cima e mais bonita.


E sua história não seria nem história se não fosse pela tragédia que se seguiria. O que de pior poderia acontecer a uma pessoa saudosista? Das tragédias, a pior. Ele começou a se esquecer.
Parou no corredor e não se lembrava para onde iria nem o que iria fazer. E aos poucos foi se esquecendo do rosto das pessoas que amou e pegou todas as fotos e era como se os rostos agora já fossem diferentes. Ele se lembrava do nome de todos. Mas não se lembrava do cheiro, nem da risada que sua amiga dava dos apelidos que ele colocava nos outros. Ele se lembrava que ganhou a gincana de férias, mas não se lembrava mais da sensação de ter ganho. Se esqueceu dos 6 primeiros livros do Harry, antes de ler o 7.
E percebeu que já não era mais como sua mãe falava: “A melhor memória que alguem poderia ter”.
E seus esforços eram em vão. Parou por alguns segundos para tentar lembrar o que seu avô sempre falava antes de dormir. Mas não adiantava. Chegou um dia que nem os nomes lembrava mais.
E o pior de tudo é saber que sente falta mesmo do que não se lembra. E vai continuar a sentir como uma certeza de que partem os amigos. Chorou pelos amigos que esqueceu. Percebeu que tentar não perder contato com nenhum amigo é como querer crescer sem perder os dentes de leite.
Arrumou a segunda gaveta do guarda roupa. A gaveta em que guardava as coisas que não eram desprezíveis suficientemente para serem jogadas fora, mas também não eram necessárias para ficarem a vista. E deu risadas da sua antiga coleção de cartões telefônicos usados, de seus restos de giz de cera e de seus pôsteres de filmes favoritos.E como se jogasse um pouco dele, jogou fora todos os cartões repetidos e deixou só suas cores favoritas de giz de cera. Era impossível guardar todas as lembranças numa só gavetas. Novas viriam e deixariam de ser guardadas por falta de espaço.
Foi fundamental um dia estarem ali. Nem o maior de todos os saudosista, seria capaz de um dia lembrar de tudo.
E depois de muito tempo reencontrou uma professora que ele sabia que gostava muito dele, mas que a muito tempo não se viam. O tempo não parecia ter passado pra ela e após se abraçarem ela disse uma única frase durante todo o reencontro ao acaso.
“Bons tempos aqueles...”
E quando ele achava que nada mais ela iria dizer, ela completou...
“... Mas melhores os de agora!”
Ela nem precisava saber como andava a vida do antigo aluno, pra saber que o agora era com certeza o melhor.
Parou e tentou respirar todos os atuais segundos antes que se esquecesse deles também.
Afinal, pior do que ter saudades é não ter motivos para senti-la. (Vinícius D'Ávila)

“Feliz é a inocente vestal! Esquecendo o mundo e sendo por ele esquecida. Brilho eterno de uma mente sem lembranças Toda prece é ouvida, toda graça se alcança.” (Alexandre Pope)