Saturday, October 22, 2011

Sempre culpa da bebida






"Aproveite que agora você é jovem para sofrer o mais que puder - lhe dizia - que estas coisas não duram toda a vida." (Gabriel Garcia Marquez)

Começou com um esbarrão em uma festa. Eu só queria ir ao banheiro, mas parei para te ouvir dizer que estava perdida e que havia bebido demais. Apesar de já te conhecer eu não achava que tinha intimidade suficiente para parar do seu lado sem ser convidado, por melhor que isso me fizesse.
Apesar de ser você a pessoa perdida, eu que fui guiado. Você segurou minha mão e me direcionou entre aquela multidão de pessoas. Todos aqueles rostos, toda aquela música, todas aquelas luzes, se tornaram só detalhes, pois naquele momento era sua mão segurando a minha que contava. Eu queria te dizer que reparei em você repetidas vezes, mas nunca dei nenhum passo porque sempre me falaram que o segredo era não demonstrar disponibilidade. E não-estar-disponível era o mais atrativo convite para você entrar na minha vida, e eu não sei se isso funcionou, mas segurar sua mão aquele momento foi como acreditar em um sim.
E enquanto eu pensava em uma maneira sutil de te pedir um beijo, você virou e me beijou. E nos beijamos durante todas as outras músicas, e todas as outras horas, mas ainda sim eu só conseguia notar os detalhes. De seus sorrisos a suas mordidas. Encantei-me por inteiro.
Nos dias seguintes tentei seguir a linha de raciocínio de disponibilidade. O problema é que agora eu pouco me importava se eu não conseguiria aparentar indiferença em relação ao que eu sentia. Eu só queria te ver novamente. Porque era simplesmente assustador imaginar o quão só eu percebi que era antes da sua chegada. Antes de te beijar eu até poderia fingir que não ligava, mas depois do beijo eu não conseguiria não dizer. Se não dissesse com palavras, diria com os gestos, com os olhos, diria com a incontrolável vontade de arrumar o cabelo quando eu te avistava de longe. Eu gostei de você por inteira, do aparelho nos dentes que brilhavam ao sorrir para mim, da cicatriz que tinha em uma das mãos, até da forma como cruzava as pernas ao sentar.
E mesmo sem marcamos, nos reencontramos.
- E gostou da festa? – Perguntei por não saber o que dizer.
- Caramba! Bebi muito! Você me viu lá?
- Vi. – respondi.
- Eu fiz alguma besteira? Porque toda hora alguém vem me contar algo que eu fiz e eu não me lembro absolutamente de nada.
- Não. Absolutamente nada.
Minha boca estremeceu incontrolavelmente a ponto de não poder distinguir se sorria ou se chorava. E por Deus, acreditei que você não se lembrava, ainda que no momento eu não havia percebido que seu nível de embriagues chegasse a esse ponto.
E apesar de ser a minha vontade, não havia porque chorar. Não poderia chorar pela perda de algo que não tive, assim como eu não poderia sentir falta de algo que nunca esteve presente. Pois se olhássemos com maior cuidado, entenderíamos que o erro não estava em você ter esquecido e sim em mim em lembrar tanto. Não houve perdas, não houve mudanças. Se houve alguma mudança, foi apenas a constatação de que estávamos sós, ainda que demorássemos a perceber, sempre estivemos todos sós. (Vinícius D'Ávila)