Saturday, March 03, 2012

A verdade sobre a fada dos dentes


"Se não vai, não desvie a minha estrela" (Gram - Você pode ir na janela)

Eu sempre tive uma dificuldade maior em desacreditar nas coisas e nas pessoas. Acreditei em Coelho da Pascoa até o fim da minha adolescência, mas só aceitei que fosse mentira depois de encontrar meus pais simulando pegadas de coelho com leite em pó. Porque para mim existiam coelhos distribuindo ovos espalhados por ai,  fadas trocando dentes por moedas, um papai que se chamava Noel.
Talvez vocês não entendam como me senti quando puxei a barba do velhinho e descobri que ela não era real. As pessoas não entendiam essa minha capacidade de acreditar e de continuar acreditando por mais que o que antecedesse me fizesse pensar ao contrário.
Foi assim também com duendes no fim do arco-íris e fadas dos dentes. A fada foi a última lenda que eu persisti em acreditar e por mais que me diziam não existir, para mim era ela que me dava moedas embaixo do travesseiro em troca de todos os meus dentes de leite.
Já mais velho arranquei no dentista o dente siso e com toda fé que eu tinha o escondi embaixo do meu travesseiro. Meus pais já não alimentavam mais minhas esperanças para o que não existia e ali era chance de provar para os outros que ter fé não era idiota ou provar para mim mesmo que era.
Dormi a tarde inteira para que o sono não me visitasse naquela noite e com os olhos entreabertos esperei a chegada da fada. Surpreendentemente, até para mim mesmo, ela veio.
E eu sorri mostrando todos os meus dentes, porque eu simplesmente não sabia dizer a ela como eu estava feliz em saber que ela existia. Leve os meus dentes, mas obrigado por me deixar com fé. Era o que eu queria dizer.
Mas enquanto eu pensava em como compartilhar como meus amigos que a fada existia sim, eles acreditando ou não, as coisas começaram a desandar.
A fada era rude e impaciente.
- Posso te dar um abraço?
- E amassar o meu vestido? Além disso estou com muita pressa. Essa regra dos dentes era apenas para dentes de leite, mas o sindicato agora mudou e nos obrigou agora dar moedas em troca de qualquer dente.
- Mas é que eu queria apenas demonstrar o quão fantástico estou sentindo ao saber que você existe.
- Pois é existo! E trabalho também. E essa conversa todo só está me atrasando. Ou vai visitar as casas das outras banguelas no meu lugar? – A fada perguntou e também respondeu. – Não. Não vai. Agora me dê logo seu dente se não levo embora a sua moeda.
As coisas deram certo, mas o certo não era como eu esperava.
Eu fiquei até o amanhecer imaginando o quão decepcionante foi o dia que mais ansiei. Questionando-me se ela não entendia que apenas pequenos gestos de gentileza teria deixado tudo tão mais bonito. Ela não precisava me visitar por todo o sempre, mas já que estava aqui, não podia ao menos sorrir como um esforço de preservar uma boa última lembrança? Mas ao invés disso partiu meu coração em vários pedaços e deixou cada pedaço doendo como se fosse um coração inteiro.
E quando já havia amanhecido eu conclui que não contaria a ninguém a existência dela.
Ela existe sim, mas levou muito mais do que me trouxe, tanto, que teria sido melhor que eu realmente estivesse enganado e ela não fosse real. (Vinícius D'Ávila)