Sunday, April 01, 2012

Eu, meu violão e as músicas que um dia escrevi


"Queria tanto que alguém me amasse por alguma coisa que eu escrevi” (Caio F. Abreu)


Enquanto os meninos da minha sala queriam jogar futebol, eu comprei um violão. Enquanto eles beijavam as meninas nas festinhas da turma, eu escrevia músicas para aquelas que eu não consegui beijar. Enquanto todo mundo decidia o que ser quando crescer, a música se decidiu por mim. Eu queria ser músico. Achava que música era a única maneira de ser feliz e não me assustava a idéia de não fazer sucesso, nem ganhar muito dinheiro. Eu me alimentava com pequenas porções de admiração, mesmo que eu passasse a vida inteira com mais músicas que fãs.
Mais do que música, eu gostava de me apaixonar. De ver alguém de repente e novamente olhar pra trás para ter certeza se havia me olhado também. E tentar adivinhar o nome e sorrir de volta numa tentativa heróica de transformar a nossa história em mais complexa e mais completa que um olhar. E escrevia uma música para cada amor que vivi. Alguns privilegiados com álbuns inteiros, outros apenas um refrãozinho dançante, mas todos, sendo retratados e aprisionados em bonitas combinações de acordes. Eu não conseguia escrever músicas falando coisas que não vivi. Era incrível como as histórias mais dolorosas se transformavam em romances bonitos quando cantadas por mim. Por mais que possa parecer um ato banal, eu gostaria que entendessem que criar uma canção pensando em alguém é como entregar um pedaço meu, que jamais poderia ser apagado. Era o melhor que eu poderia fazer por alguém, por mais que a música não te excitasse a ponte de chorar, nem dançar.
E me apaixonava tanto e tanto que por vezes acreditei ter mais de um coração. Mas aparentemente esquecia-me e desvencilhava tão rapidamente dos espinhos que ficavam, que por vezes também pensavam que poderia não ter nenhum. Mas só eu sei o quanto sofri a aceitar cada melodia que não se tornou real. Só eu sei o quanto eu amei cada canção que escrevi, por mais que tenhamos conceitos diferentes sobre amor.
E eu queria que fosse ela. Porque me indignava a facilidade com que me agradava apenas me direcionando sorrisos, enquanto eu me esforçava tanto com assuntos interessantes e piadas inventadas para te agradar na mesma intensidade. Eu queria que ela fosse minha primeira música feliz.
Mas eu sabia que nunca seria minha quando percebi que não falava de mim para suas amigas, que não ajeitava seu cabelo quando eu chegava e que não retornava de imediato as minhas mensagens.
Talvez não se interessasse pela pessoa que conheceu, mas poderia amar o músico que havia dentro de mim. Foi então que gravei minhas melhores canções e te entreguei num cd grafitado por mim.
Lembro que você pegou sorrindo sem entender e curiosa ao me ouvir dizer que todas fui eu que escrevi. Lembro também que era terça e eu nem sabia que você sabia onde eu morava, mas da janela do meu quarto eu ouvi você bater na porta e eu correndo para atender ansioso para ouvir o que você tinha para dizer. Eu escondi minhas mão tremulas para esconder meu nervosismo, mas os lábios me entregaram ao tremer enquanto eu perguntava para você.
Você foi elogiando cada canção, e parava alguns segundos olhando para o teto como se buscasse um novo elogio a cada explicação para que não banalizasse a admiração. E você dizia o quão verdade parecia as canções e como algumas delas parecia ter retratado a sua vida.
Você me pedia para eu nunca parar de cantar e eu só queria te pedir um abraço.
Quando meus lábios de tão trêmulos pareciam que iriam cair do meu rosto e a felicidade do mundo todo se resumia na sua mão segurando a minha, você me explicou o motivo da visita.
Estava apaixonada e não era por mim, mas sentiu que eu entendia bastante de amor e precisou compartilhar tudo aquilo comigo. Mal sabendo ela que todos os meus conhecimentos sobre amor era o que eu sentia por ela. Mas não era conselhos que você queria. Era uma canção.
Você queria que eu escrevesse algo novo, para ser cantado a ele, numa tentativa final de conquista. Você queria me contar toda a sua história para que a música se aproximasse o máximo possível do real, sem saber que me matava em pequenas doses.
Escrevi e te ensinei a canção com o nome que você pediu. Coloquei notas fáceis para que rapidamente aprendesse a tocar e fosse lá cantar para ele o que provavelmente eu passaria a vida toda desejando que fizesse para mim.
E por muito tempo ela não mais voltou, mas chegou até mim que eles estavam juntos.
Ela nunca voltou para dizer o resultado daquela ação, o capítulo final da novela, pra revelar a mim com quem a mocinha ficou. Mas eu sei que ela cantou pra ele. E o incrível foi perceber que o doloroso não era esperar o resultado ou não tê-la cantando para mim. O doloroso se resumia a um simples fato. Ela cantou para ele, sem nunca saber que a música havia sido escrito pra ela. (Vinícius D'Ávila)